Importância do manejo ex-situ da espécie humana (Homo Sapiens)
A espécie Homo sapiens, à qual pertencemos, está classificada na ordem Primataes e na família Hominidae.
Sim, para quem não se recorda somos uma das milhões de espécies que habitam — e que já habitaram — esse planeta.
E nesse momento de pandemia, onde riscos iminentes à nossa sobrevivência e nossa preservação nos foram impostos por conta do SARS-CoV-2 — causador da COVID-19 —, é essencial que sejam providenciadas diversas condições e estruturas de apoio para garantir nossa sobrevivência, nossa conservação.
No manejo conservacionista de espécies ameaçadas utilizamos dois termos: IN-SITU e EX-SITU. Ações IN-SITU referem-se a atividades realizadas onde as espécies ocorrem naturalmente. Por sua vez, ações EX-SITU referem-se a atividades para ações realizadas fora do ambiente de ocorrência usual de uma determinada espécie.
A nossa espécie, Homo sapiens, mais do que nunca precisa ser submetida a um manejo EX-SITU, ou seja, viver sob protocolos e rotinas em prol da sua conservação, porém fora do nosso lugar de origem, fora do nosso “ambiente” comum ou usual onde vivíamos e conduzíamos nossas vidas.
Nessa metáfora conservacionista preciso explicar que os ambientes IN-SITU de nossa espécie seriam nossos locais de trabalho, de lazer, de convivência como grupo social — comportamento que nossa espécie exige e precisa. Os atuais ambientes IN-SITU do ser humano podem ser nas cidades — nossas “selvas de pedra” —, locais menos preservados em relação aos aspectos naturais; ou em recantos interioranos mais preservados, portanto, potencialmente bem mais saudáveis para o “bicho-homem”. Ainda fazendo uso dessa metáfora, e com toda a licença poética da qual tenho direito, explico que o ambiente EX-SITU para nossa espécie, montado e preparado para prover tudo o que precisamos para viver, sobreviver, reproduzir, criar nossos filhotes etc., são exatamente os ambientes e recintos onde estamos vivendo nos últimos 70 dias.
Para alguns de nossa espécie, estes locais de manejo EX-SITU são ambientes bem elaborados, pois são sítios, fazendas, chácaras, grandes casas e apartamentos bem estruturados. Penso que, nestes ambientes, viver o tempo que for necessário para garantir a perpetuação de nossa espécie é muito mais eficaz, e promove muito mais saúde e bem-estar. Em outros recintos, como casas e apartamentos mais humildes, começa a ficar mais difícil prover o mesmo bem-estar. Se formos considerar as áreas com estruturas mais frágeis, sem o mínimo de saneamento básico, essa missão conservacionista e a promoção do bem estar se torna quase impossível. Fica claro que para se manejar adequadamente uma determinada espécie em situação vulnerável, quanto melhor a área, melhor o resultado.
Nesse ambiente EX-SITU, tudo está, ou pelo menos deveria estar, sendo providenciado para nos prover saúde física e mental. Temos vários recursos de enriquecimento ambiental, como TV, internet, jogos digitais, jogos de tabuleiro. Temos uma boa nutrição, pois conseguimos comer de 3 a 4 vezes por dia, e contamos com suporte médico, seja ele privado ou o Sistema Único de Saúde (SUS). Estamos sendo bem manejados, e creio que, mesmo com tantas baixas tristes, trágicas e indesejáveis, manteremos nossa população vigorosa o suficiente para seguir em frente ao voltarmos para nossos ambientes usuais, ou seja IN-SITU.
O ambiente IN-SITU da nossa espécie é onde vivíamos “livres” e circulávamos tranquilos, indo e vindo para onde bem quiséssemos. E é neste ambiente de nossa espécie, que em meio à pandemia muitos bravos profissionais de diversas áreas continuam em campo, se expondo a riscos muitas vezes desconhecidos, todos com o propósito de desvendar o que nos ameaça e fazendo todo o possível para recuperar, restaurar ou prover mínimas condições ambientais para que nossa espécie possa voltar a viver da melhor forma — seja da forma usual como conhecíamos, ou mesmo sendo um novo “normal”. Acredito que isso irá acontecer, não somente pelo potencial que nossa espécie tem em resistir, mas principalmente porque os profissionais que estão em campo — médicos, enfermeiros, policiais, garis, comerciantes, produtores, cientistas — são apaixonados pelos que fazem e estão dando seu melhor.
Tudo isso me é muito familiar! E sabem por quê? Porque trabalho com zoológicos e aquários. Com instituições comprometidas com a conservação da fauna e da flora e com a restauração de ambientes naturais, para promover a segurança hídrica, alimentar e ambiental que todas as espécies precisam. Zoológicos e aquários são instituições que há anos lutam para conservar milhares de espécies ameaçadas de extinção, em um número cada vez maior, e que não para de crescer devido às ações da nossa própria espécie: a humana. Zoológicos e aquários representam centenas de profissionais, também apaixonados por sua missão conservacionista. São veterinários, zootecnistas, biólogos, educadores, gestores e toda uma enorme cadeia operativa que conta com profissionais que atuam tanto de forma IN-SITU como EX-SITU.
No ambiente EX-SITU dessa grande variedade de espécies — que é exatamente nos zoológicos e aquários — lutamos para atualizar as instalações e melhorar a infraestrutura, para que possamos prover cada vez mais saúde e bem-estar para os animais sob nossos cuidados, assim como fazemos atualmente com nossas famílias, dentro de casa. Nos ambientes IN-SITU de todas essas espécies, atuamos corroborando e financiando projetos de pesquisa e conservação para uma grande variedade de ecossistemas e biomas, fazendo todo o possível em criar condições para manter as populações desses animais na natureza, muitas vezes devolvendo, soltando ou reintroduzindo espécies em seu habitat.
No caso da missão conservacionista dos zoológicos e aquários, temos alguns agravantes, pois além do COVID-19, ainda precisamos lidar com a falta de recursos, com o combate ao tráfico de animais, com desmatamento e incêndios, com a falta de cumprimento das leis ambientais, e outras doenças terríveis como febre amarela, raiva, tuberculose, malária e leishmaniose, que se não forem devidamente manejadas podem inclusive impactar sobre a própria espécie humana.
Instituições comprometidas com os propósitos mencionados acima promovem experiências positivas, provocam mudanças no comportamento dos seus visitantes e colaboradores, fortalecendo tanto o senso comum de maior zelo pela natureza, como a adoção de condutas mais sustentáveis em seu dia-a-dia.
Aproveite esse momento de quarentena para saber mais sobre o que o zoológico e o aquário do seu município ou do seu estado, estão fazendo direta e indiretamente para garantir não somente a saúde e o bem estar para a espécie humana (Homo sapiens), mas também para tantas outras espécies com as quais precisamos aprender a coexistir de forma sustentável, ao manejar espécies ameaçadas de extinção, prover ações de sensibilização ambiental e restauração ecológicas.
Por Gerson Norberto.
Elephas Maximus Projetos e Consultoria Ambiental.