Animais domésticos sob cuidados humanos, ou cuidando de humanos?
Uma abordagem sobre o auxílio dos Animais de estimação no tratamento de distúrbios emocionais e psicológicos.
Por MV. Milena Mota
Que o convívio com animais e a natureza trás benefícios a saúde física e mental dos seres humanos todos nós já sabemos. Porém há algum tempo esses benefícios vêm tomando um novo patamar. Com o atual modelo de vida, onde corre-se exaustivamente atrás da tão sonhada estabilidade, as pessoas se tornaram mais solitárias e introspectivas, dando início então a era das doenças de cunho emocional e psicológico. Nesse aspecto os animais entram com um papel expressivo, sendo condutores de bem estar e apoio emocional.
Psicólogos e médicos passaram a prescrever para seus pacientes, o convívio com animais para auxiliar em seus tratamentos com intuito de redução de sintomas ou até mesmo cura da doença. Já foi comprovado que a simples presença de animais como apoio emocional reduz frequência cardíaca e pressão arterial, causa a liberação de hormônios ligados à sensação de bem estar, redução de cortisol sérico, além de distração de pensamentos destrutivos e até suicidas, reduzindo a taxa de crises de pânico, ansiedade, medo e depressão. Em casos críticos, estes animais se tornam a razão de viver dos seus tutores, vistos como a luz no fim do túnel. Em alguns países cães de apoio emocional já podem viajar em aviões ao lado de seus tutores mediante relatório médico ou psicológico.
Existem ONGS por todo o mundo que levam animais aos hospitais para terapia de pessoas portadoras de doenças terminais como o câncer ou a manicômios onde atuam como agentes tranquilizadores. Outras treinam principalmente cães, para que estes animais deem o melhor suporte aos seus futuros tutores, portadores de distúrbios psicológicos. Autistas e epiléticos se beneficiam com a presença de animais que identificam, precocemente, episódios de crise dando apoio emocional e evitando que essas pessoas se machuquem no decorrer do processo. E aí entra uma questão importantíssima, animais terapeutas precisam ter características que os qualifiquem para esta atividade de apoio emocional, assim como cães guia utilizados por cegos. Estes indivíduos precisam ser sociáveis com humanos e outros animais e saudáveis física e psicologicamente para que esta relação seja o mais agradável e leve possível.
Pessoas com distúrbios emocionais e psicológicos necessitam de uma rede de apoio de familiares, amigos e profissionais na tentativa da manutenção do seu estado emocional, contudo os animais destinados a estas pessoas precisam ser abraçados por esta rede de apoio já que quem cuida também precisa ser cuidado.
O numero de pacientes veterinários levados aos consultórios com problemas psiquiátricos ou físicos causados por espelhamento ao seu tutor aumentaram paralelamente ao crescente numero de tutores solitários que colocam em seu animal de estimação a carga de ser o seu mundo, sendo assim a escolha de animais terapeutas deve ser feita de forma consciente e tranquila, necessitando uma análise comportamental e psicológica do indivíduo a fim de determinar se este está apto para esta função. É importante salientar que qualquer animal pode ser um animal de estimação terapeuta, desde que seja saudável, sociável e não traga nenhum risco a segurança de outras pessoas e animais.
É nesse contexto que entra em cena o conceito de posse responsável que pode ser definida como a decisão consciente em assumir um animal de estimação, visando atender a todas as necessidades do mesmo, garantindo-lhe bem estar e saúde necessária. Lembremos então das cinco liberdades dos animais que são estar livre de fome e sede, estar livre de desconforto, estar livre de dor, doença e injúria, ter liberdade para expressar os comportamentos naturais da espécie, estar livre de medo e de estresse. Isso se traduz em saúde física e mental desses companheiros.
A terapia com animais também pode ser realizada em locais específicos para a prática com uma equipe multidisciplinar de médicos, psicólogos e médicos veterinários, assim a manutenção da saúde desses animais se faz de forma mais controlada e eficaz levando em conta questões de saúde pública como o controle de zoonoses e redução de acidentes entre animais e pessoas.
Embora os cães sejam os animais mais utilizados para fins de zooterapia, pela facilidade para seu treinamento bem como seu alto perfil social, outros animais como gatos, coelhos, tartarugas, cavalos, hamsters, golfinhos e aves, animais exóticos como iguanas e escargot (MARTINS, 2004) e animais de fazenda (BERGET & BRAASTAD, 2011), também podem ser utilizados para fins de terapia assistida por animais.
No Brasil esta pratica tem se difundido nos últimos anos, porém a falta de regulamentação coloca um grande entrave nas possibilidades que existem, como a entrada de animais em clínicas e hospitais com fins terapêuticos. Existem dois projetos de leis sobre o assunto sendo eles o Projeto de Lei N° 4.455 de 2012, sobre a utilização da terapia assistida por animais através do Sistema Único de Saúde – SUS e, o Projeto de Lei N° 264 de 2012 para a prática da Equoterapia. As questões legais são de suma importância para a garantia do bem estar e direito desses animais, sejam eles mantidos em instituições ou companheiros domiciliares.
Neste sentido nunca foi tão crucial o entendimento de que fazemos parte de um todo, sendo assim dependemos uns dos outros para que consigamos viver em harmonia e equilíbrio, ou seja, um animal sem saúde psicológica não pode dar suporte emocional ao seu tutor, um animal doente trará mais angustias ao seu tutor que o ver como o seu ponto de apoio. Faz-se necessário então que estes animais tenham alguém, que faça parte da rede de apoio do seu tutor, realmente responsável pelo seu bem estar físico e psicológico, averiguando se suas necessidades quanto individuo estão sendo atendidas e que os levem ao médico veterinário com periodicidade mantendo sua saúde preventivamente.
Além dos aspectos físicos, assim como pessoas com atividades estressantes como médicos humanos e veterinários, policiais e bombeiros precisam de uma válvula de escape, esses animais também precisam. Precisam ter o momento de serem só animais realizando as atividades inerentes à sua existência, assim estarão aptos a realizarem o seu trabalho de terapeuta dando além de apoio, amor, e nisso eles são mestres! Prover o bem estar dos animais de estimação, que cuidam direta ou indiretamente de pessoas, é uma recomendação intrínseca e notória para uma relação saudável!
BERGET, B.; BRAASTAD, B.O. Animal-assisted therapy with farm animals for persons with psychiatric disorders. Annali dell´Istituto Superiore di Sanità, v.47, n.4, p.384-390, 2011.
MARTINS, M.F. Zooterapia ou Terapia Assistida por Animais (TAA). Revista Nosso Clínico, v.40, p.24-26, 2004.